Hoje é 2 de Novembro, dia de Finados aqui no Brasil.
Feriado. Um dia separado no calendário para pararmos o que estamos fazendo e nos lembrarmos
daquelas pessoas que se foram, de lamentarmos suas ausências, de visitar
túmulos e ficar na nostalgia de um tempo que é impossível voltar.
Esse dia sempre me incomodou, achava tétrica essa coisa de
visitar um cemitério e ficar lá lamentando a morte de alguém. As imagens associadas a esse dia também são péssimas, de pessoas cabisbaixas, flores murchas, tons escuros e sombreados. Mas no fundo
mesmo o que me incomodava era esse olhar negativo que se cultiva, talvez sem
nos darmos conta, de prestar atenção apenas na falta que a pessoa falecida nos faz. A tristeza coletiva é tanta que geralmente chove nessa data.
Acho que esse olhar da falta fala muito mais de nós, os
vivos, que aprendemos uma percepção da vida focando nas coisas que nos faltam.
Lamentando pelo que não podemos ter. Talvez o ato de lamentar nos conecte com
uma falta maior, primordial e primitiva, anterior até ás nossas memórias de infância.
Aquele vazio em nós que é intolerável e que buscamos preencher a todo custo:
falamos demais, comemos demais, compramos demais, corremos demais... o quanto
nos custa preencher esse vazio da nossa singularidade.
Por outro lado, pode ser um contraponto positivo incorporar
o olhar das culturas mais antigas que tradicionalmente, sobre o tema dos “mortos”,
celebra a vida dessas pessoas que já partiram com festas, cantos e comidinhas.
Sim, celebrar, uma palavra por si só positiva. Diferente de
lamentar a partida, celebrar o tempo de permanência daquela pessoa, valorizar as
trocas que nos foram possíveis fazer com ela e os momentos que passaram juntos me
parece enriquecedor justamente por vivificar em nós aquela nossa parte humana
que conectou com aquele que partiu.
Encontrar esse elo humano nas nossas relações é uma bela
poesia de quanta beleza a vida pode nos proporcionar com a convivência, a co-vivência. Quando conectamos com
essa parte, da pessoa querida, que um dia nos tocou, é como se voltássemos na
linha do tempo e mais uma vez aquela centelha de luz divina que havia nela por
um momento se acendesse novamente. O tempo é relativo, já disse o físico.
Hoje não me incomodam mais as representações deste dia com
as tradicionais “caveirinhas mexicanas”. Antes sim, caveiras me pareciam
fúnebres demais, porque eu também tinha esse olhar de quem lamenta e as
caveiras eram assustadoras representações da falta.
Para além das modinhas, entendo o real sentido das
culturas antigas que guardavam os crânios de cristal na intenção de honrar o
que poderia representar a concentração de tudo que subsistiu em uma pessoa.
Como se o crânio fosse a cristalização daquelas experimentações dela ao longo da vida, seus
aprendizados, exemplos e evoluções, e contivesse também as memórias dos momentos compartilhados
conosco.
Para este dia minha intenção é celebrar esses elos que
consigo enxergar nas histórias e momentos que compartilhei com quem já
prosseguiu para outros planos, honrando as conexões que pudemos vivenciar e
levando dentro de mim a riqueza do que pudemos sentir juntos, para além do
tempo.
Pra mim é um dia especial para olhar pra mim mesma e honrar tudo que levo vivo dentro de mim, me dando conta do quanto sou resultado dessas conexões amorosas que me foram possíveis. Dia de praticar a afirmação "Mitakuye oiasin", que quer dizer "por todas as minhas relações".
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