A imagem mostra uma criança muito contente montada
num cavalo branco e segurando um estandarte cor de laranja, cercada de girassóis
num jardim murado, e atrás dela brilha altivo o Sol do meio dia com todo seu
calor e radiância. Tudo nesta carta é alegre!
A carta do Sol e toda sua simbologia vem nos falar
de um feliz renascimento, aquele que acontece quando finalmente nos conhecemos em
toda nossa essência e verdade.
A criança está nua e todos os elementos da carta olham para a frente, pois não há medo de se expor de forma verdadeira.
A criança é o símbolo da nossa espontaneidade,
aquele atributo que ficou escondido enquanto íamos construindo uma
personalidade a partir do que os outros queriam de nós. Foi necessário
atravessar todos os arcanos anteriores para que pudéssemos resgatá-la, mas
enfim a criança interna conseguiu emergir e agora é ela quem guia a nossa
vontade.
A vontade interna está simbolizada pelo cavalo
branco, o veículo de externalização daquilo que nosso coração realmente deseja
e que agora a criança poderá conduzir livremente por onde quiser andar.
O cavalo branco é um símbolo poderoso no território
do inconsciente. Freud expôs sua teoria psicanalítica sobre a sexualidade
humana ao escrever “O Caso do Pequeno Hans”, quando acompanhou um menino que sonhava
com cavalos brancos que devoravam seu pênis. Estudando a relação simbólica dos
elementos desse sonho infantil, Freud desenvolveu a base de toda a psicanálise,
identificando a energia sexual como mobilizadora primordial dos indivíduos e os
possíveis caminhos para manifestação dessa energia na vida adulta considerando
a capacidade de interação com as figuras materna e paterna no Complexo de
Édipo.
Foi estudando o pequeno Hans que Freud percebeu a relação
simbólica entre falo-poder-cavalo branco e como esses símbolos estão
interligados na busca de cada pessoa pelo seu próprio poder pessoal e
autoafirmação.
A cor laranja dá o tom dessa carta, já que é uma cor
vitalizadora e que evoca o positivo. O laranja é usado na cromoterapia por seu
comprimento de onda ter a capacidade de eliminar miasmas e conteúdos energéticos
externos que ficam grudados no nosso campo magnético, é uma cor
desimpregnadora. Neste arcano, tudo que for influência externa, tudo que não
vem da espontaneidade da própria criança, fica de fora.
O espaço é murado porque agora a criança está
protegida em seu próprio território psíquico, ela já sabe o que é realmente
genuíno de sua parte e cultiva seu jardim interno para que os girassóis possam
crescer e sorrir de volta para ela. Nesse espaço sagrado só entra quem tem
respeito pela sua trajetória, já que levou tempo para que esse jardim interno fosse
cultivado, cuidado e pudesse florescer.
Aqui já não há mais necessidade de ataques ou de ativação
dos mecanismos de defesa, até porque já foram percorridos os arcanos anteriores
que simbolizam os momentos de iluminação das sombras e retomada da consciência sobre
repetições e vitimismos.
O arcano do Sol acontece naturalmente quando a
pessoa, numa atitude de autorrespeito e autopreservação, consegue se manter
protegida psiquicamente por se colocar conscientemente fora das situações de
risco. Isso envolve aprender a escolher as companhias, situações e ambientes,
evitando tudo aquilo que possa ser tóxico e impedir seu desenvolvimento
saudável.
E até o Sol é uma entidade nessa carta, com um rosto
e uma expressão próprios. A criança da carta parece coroada de Sol, literalmente
iluminada pelo astro rei. O Sol representa a emanação divina primordial; é pela
luz do Sol que recebemos a consciência do amor e da verdade. É também pela ação
da luz do sol no corpo que nós produzimos as vitaminas e hormônios que
estimulam um crescimento físico saudável - e é nos lugares do planeta onde há
menor insolação anual que se registram índices mais altos de depressão e
suicídio.
A emanação solar nos traz luz e calor e a carta do
Sol fala desse momento em que nossa existência é a própria manifestação divina da
iluminação e do amor sobre a Terra. Podemos nos tornar deuses criadores da
nossa realidade quando assumimos a direção dos nossos cavalos brancos e manifestamos
nossa vontade no mundo concreto, realizando aquilo que realmente emana do nosso
coração – o sol interno.
Isso é real autodeterminação, ter liberdade para
fazer aquilo que genuinamente se deseja. E sem esperar um olhar de aprovação do
outro para aquilo que queremos, apenas nos permitindo realizar.
Sempre que há espaço para esse alinhamento
verdadeiro do indivíduo com sua essência, o resultado será positivo para ele e
para os outros. Porque na essência todos somos luz, todos somos manifestações
divinas. Podemos ser encobertos pelas interpretações equivocadas que fazemos do
nosso ambiente e entorno, mas conforme vamos recobrando a consciência sobre nós
mesmos e sobre a nossa verdade, vamos também resgatando a clareza sobre a vida,
sobre nossas atitudes, capacidades e possibilidades.
Quando chegamos nessa compreensão sobre nós mesmos,
não há mais insegurança para nos mostrarmos ao mundo como somos. E mais, não
temos reservas para compartilhar com os outros a satisfação de estarmos livres
para sermos nós mesmos. Vejam só que linda essa representação do arcano do Sol
na coleção Bota Tarot, ao mostrar duas crianças nuas brincando sob o Sol.
Elas compartilham do momento de alegria porque a
atitude espontânea da criança quando se sente feliz é o compartilhar. A
aproximação com o outro não é mais temida, o outro não é mais uma ameaça se ele
também for inteiro.
Mas apesar da espontaneidade ser um atributo primordial
na atitude humana, restringimos o olhar à espontaneidade como algo infantil no
sentido negativo. A espontaneidade cabe somente à infância porque na vida
adulta não podemos ser espontâneos, na vida adulta não cabe qualquer atitude
impensada, temos que estar vigilantes para perceber e avaliar onde cabem e onde
não cabem certas atitudes.
Na
verdade, é ainda na infância que vamos percebendo que nossa espontaneidade não
tem lugar no mundo dos adultos. D. Winnicott percebe que até os bebês vão
moldando seu comportamento conforme o humor e a expressão das mães para com
eles. No seu livro “O Brincar e a Realidade”, ele propõe o seguinte entendimento:
“O bebê rapidamente aprende a fazer uma previsão: 'Por enquanto, posso ficar seguro, esquecer o humor da mãe e ser espontâneo, mas, a qualquer momento, o rosto dela se fixará ou seu humor dominará; minhas próprias necessidades pessoais devem então ser afastadas, pois, de outra maneira, meu eu (self) central poderá ser afrontado'.”
“O bebê rapidamente aprende a fazer uma previsão: 'Por enquanto, posso ficar seguro, esquecer o humor da mãe e ser espontâneo, mas, a qualquer momento, o rosto dela se fixará ou seu humor dominará; minhas próprias necessidades pessoais devem então ser afastadas, pois, de outra maneira, meu eu (self) central poderá ser afrontado'.”
Assim,
crescemos com a falsa noção de que sermos nós mesmos é um fator de risco à
nossa segurança, só sobreviveremos e teremos nossas necessidades atendidas se
nos adaptarmos às exigências do ambiente e ao que as outras pessoas esperam de
nós. E no final, vamos perdendo nossa espontaneidade, vamos enrijecendo,
perdendo a flexibilidade. Cada vez mais, vamos nos distanciando da nossa
criança interna que quer brincar e compartilhar sua felicidade com as outras
pessoas.
Ao descrever a simbologia do sol, dos círculos e das
mandalas, Jung na sua obra “O homem e seus símbolos” cita Marie Luise von Franz,
que realmente foi muito feliz em sua conceituação sobre o elemento circular
enquanto representação da verdade individual de cada um:
“...
o círculo (ou esfera) como um símbolo do self: ele expressa a totalidade da
psique em todos os seus aspectos, incluindo o relacionamento entre o homem e a
natureza. Não importa se o símbolo do círculo está presente na adoração
primitiva do sol ou na religião moderna, em mitos ou em sonhos, nas mandalas
desenhadas pelos monges do Tibete, nos planejamentos das cidades ou nos
conceitos de esfera dos primeiros astrônomos, ele indica sempre o mais
importante aspecto da vida — sua extrema e integral totalização.”
É daí a importância do Sol como símbolo máximo da
integração da personalidade ao ser interno mais puro, da integração total do
Ego.
O círculo não tem começo nem final, é uma unidade em
si mesmo. A psiquiatra brasileira Nise da Silveira, que se dedicou profundamente
ao estudo da esquizofrenia, notou a repetição dos símbolos solares nas figuras
produzidas pelos seus pacientes esquizofrênicos, o que a levou a se aproximar
de Jung e com ele organizar uma exposição das pinturas desses pacientes.
Para Nise, a esquizofrenia seria uma fragmentação do
ser interno que se perde de si nesse processo de atender às demandas do mundo
externo, levando-o a um isolamento e permanência no seu mundo interno próprio.
Ao proporcionar momentos para que os pacientes lidassem com sua energia
espontânea e criativa, eles buscavam novamente pela unidade desse ser interno
produzindo figuras circulares e a partir dessas produções criariam pontes para
ser relacionarem novamente com os outros.
Viver o arcano do Sol é resgatar a espontaneidade da
criança e a unidade do ser interno que pode viver em seu mundo interno e também
no mundo externo, dando lugar para sermos e agirmos novamente conforme a nossa
verdadeira natureza.
Talvez a maior expressão desse momento solar arquetípico
aconteça quando estamos dançando. A dança une o corpo, a emoção e a mente,
todos alinhados a fim de criar um resultado físico. Na dança, o indivíduo está
concentrando sua energia para manifestar através do corpo o que ele sente internamente
e faz isso com um comando mental que decodifica esse sentir e o traduz em
movimentos corporais.
A dança espontânea é também uma ponte eficiente para
resgatar o contato com a criança interior, porque evoca essa conexão
mente-emoção-corpo que é natural na infância e vai sendo esquecida conforme
crescemos e nos esforçamos para nos encaixar nas opções que nos dão ao longo da
vida.
Dançar pode ser uma ótima maneira de trazer nossa
espontaneidade à tona novamente, e conforme vamos permitindo esses momentos de
conexão com nossa criança interna a vida externa vai se abrindo também para
deixar que essa energia emerja, quebrando os enrijecimentos e inflexibilidades internos
e realinhando a nossa realidade com a nossa verdadeira vontade. Assim como é
fora, é dentro.
E justamente o aspecto lúdico da dança corrobora com
a tese terapêutica de Winnicott, que afirma que "é no brincar, e somente no brincar, que o indivíduo, criança ou adulto, pode ser criativo e utilizar sua personalidade integral: e é somente sendo criativo que o indivíduo descobre o eu (self)".
Nesse sentido, eu gosto muito da representação do arquétipo
do Sol feita na coleção Gaian Tarot, colocando a dança como expressão dessa
liberdade espontânea e criativa. Nessa representação, a felicidade de agir
livremente reluz todo o nosso brilho de dentro para fora.
Quando esta carta surge numa leitura de tarot, indica
que este é um momento de alegria, vitalidade, sucesso e bem estar. Pode indicar
também uma fase da vida em que finalmente você possa se sentir em paz com sua
história pessoal e permita-se a alegria de deixar sua essência vir à tona. É
tempo de agir com liberdade e espontaneidade, sem amarras e sem medo do
julgamento dos outros.
Viva toda a felicidade de ser quem você é!
Astros - Tarot - Psicanálise
Maravilhoso!!Obrigada
ResponderExcluirObrigada por acompanhar!
Excluir