quarta-feira, 27 de novembro de 2019

Lunação de Sagitário - 27/11/2019

Verbenna Yin


A lua nova em Sagitário traz a vontade de expandir para sair do ordinário e da mesmice da vida. No momento da lunação Sol e Lua estão atravessando a casa 9 para a 10, setores de desenvolvimento profissional e reconhecimento do nosso valor - e os astros prometem ajudar quem está buscando novas oportunidades, especialmente quem precisa se sentir mais reconhecido na vida profissional e afetiva.

Saímos das revisões de Mercúrio retrógrado em Escorpião e é possível que você já tenha assimilado o que era necessário ajustar no seu momento de vida e talvez até já tenha feito alguns movimentos pra isso. Pois bem, agora é o momento de se colocar no mundo assumindo que essas decisões já aconteceram e daqui pra frente seus esforços serão no sentido de concretizá-las e isto é o extraordinário da temporada de Sagitário, a gente perceber que está em outra etapa de vida e passar a agir de acordo com o que esse outro momento pede.

Deixar de agir como sempre fizemos, quando isso nos mantinha indefinidamente numa situação desconfortável, significa muito e nos aproxima da vida que queremos ter. Mas este é o melhor momento do ano para a gente seguir com confiança na direção do coração, afinal, este período será regido por Júpiter, o grande benéfico, que está em sua morada e assim tem seus efeitos fortalecidos nessa região do céu. Isso significa que é hora de pensar grande e colocar mesmo seus planos em ação.

Veja onde você tem Sagitário no seu mapa de nascimento pois esta será a área que tem tudo pra crescer e trazer muito contentamento pra você.

Mas isso ainda pode melhorar: Vênus está também alinhada com Júpiter em Sagitário e isso faz com que não só os esforços de crescimento sejam recompensados mas também que a experiência toda seja prazerosa, leve e sem complicações. Partindo para o extraordinário, também vamos nos sentir muito bem de podermos conduzir nossa vida pelos caminhos que realmente queremos.

O Centauro é o símbolo de Sagitário e essa figura mítica metade homem e metade cavalo nos lembra duas coisas. A primeira delas é que a parte superior desse ser é a figura humana, então se existe uma cabeça humana é porque os pensamentos e a razão são necessários para que a evolução aconteça. É a razão, o desejo de conhecimento e o compromisso com a verdade que movem esse ser por inteiro.

Mas o centauro também é metade cavalo e essa parte animal o conecta com os instintos e com a força da natureza na hora de se movimentar. Simbolicamente, essa metade animal traz força e vitalidade para que se coloquem em prática as ideias que vem da metade humana.

O animal não pensa, ele age direcionado pelo instinto que o predispõe a um determinado comportamento. Se estivermos conectados apenas com a parte animal, podemos seguir esse padrão agindo compulsivamente e sem domínio das nossas realizações.

Mas aqui o desafio é a gente se mover pela metade superior humana, pela razão e pela nossa capacidade de interagir com a realidade das coisas. É a mente humana que domina os impulsos animais e nesta lunação nosso trabalho será identificar que forças tem nos impulsionado como cavalos selvagens, percebendo como somos capazes de dominar essas forças e utilizar delas com inteligência, direcionando-as para aquilo que desejamos e não mais ficando reféns dessa repetição.

Então tome as rédeas da sua vida e passe a fazer as escolhas que estejam mais coerentes com este seu novo momento.

Marte e Mercúrio estão em Escorpião e fazem um alinhamento harmônico com Júpiter e Vênus, reforçando as mudanças e promovendo uma renovação da nossa maneira de entender as coisas, trazendo uma perspectiva diferente para que você possa priorizar seus novos caminhos e manter-se neles. Marte nessa posição nos ajuda a fortalecer o compromisso com a nossa verdade interior e dá persistência para seguirmos acreditando neste novo melhor. Daqui a pouco as coisas se comprovam e você vai se questionar porque não fez isso antes!

Todos esses posicionamentos conversam com Urano em Touro e teremos que reconhecer que esse desejo pelo extraordinário já estava ali fazia tempo. E o que é esse extra-ordinário?

Pode ser aquilo que está fora do ordenado pelo nosso dia a dia, algo que está além do nosso alcance enquanto estivermos na mesma ordem das coisas. Para o extraordinário chegar é preciso dar lugar a uma nova ordenação, realocar nossas prioridades e permitir que algo diferente do habitual se estabeleça.

Então, alguma desordem temporária pode acontecer até esse extraordinário vir. Não se incomode com isso, faz parte do processo. Perceba que o que está para chegar vale o esforço dessa reorganização.

Netuno conclui sua retrogradação e está marcado no ascendente da lunação, indicando que aquele tempo onde estivemos iludidos com interpretações erradas da realidade já passou. Agora é um momento em que não cabe mais condescendência com o erro, se você está vendo o buraco bem aí na sua frente, desvie dele!

Coletivamente, Netuno se harmoniza com o Nodo Lunar em Câncer e estamos num momento muito importante para restabelecer verdades e reafirmar valores realmente positivos. Poderemos ver este mês algumas histórias passadas a limpo, inclusive judicialmente, e reparações sendo feitas para desconstituir versões falsas da realidade em que nos fizeram acreditar. A mentira vai ruir.

Quem está do lado da verdade e da justiça precisa se posicionar, por mais cansativo que seja ter de reafirmar o óbvio. Estamos para cruzar uma linha limite no início de 2020 onde a tendência à repressão das expressões individuais estará mais forte. Por isso, não deixe de dar o exemplo e sustentar os valores democráticos hoje. Se você acredita que o mundo é um lugar para todes, aja tolerantemente e ajude a garantir o acesso que o outro precisa para ter os mesmos direitos que você. Criar um mundo com justiça de oportunidades é realmente extraordinário.

sexta-feira, 15 de novembro de 2019

Arquétipos vivos na Bolívia

Os arquétipos são vivos.

Temos acompanhado o que vem se passando na Bolívia e existem pontualmente dois arquétipos muito fortes se manifestando por lá.

O primeiro é o arquétipo de Lilith, que foi manifestado na agressão desferida à prefeita de Vinto - que foi sequestrada, agredida durante 4 horas, teve seu cabelo cortado e pintado de vermelho e tudo foi transmitido ao vivo pelas redes sociais.

O mito de Lilith representa uma predisposição a punir a mulher que ousa sair do seu lugar de submissão, como Patrícia Arce fez ao ocupar hoje uma posição de exercício do poder como prefeita. Lilith tem longos cabelos vermelhos e Patrícia foi punida com a perda dos cabelos e marcada por essa mesma cor. Patrícia foi acusada de suscitar o ódio com sua atuação em prol da igualdade social, como Lilith foi punida por exigir igualdade à condição feminina.


verbenna yin


E olhem que coincidência, nesse dia a Lua estava conjunta a Lilith. No horário dos vídeos que transmitiram a agressão (18h) Urano estava na linha do ascendente. 

E outro arquétipo que está vivo nos Altiplanos é Prometeu, o titã que amava a humanidade e ousou roubar o fogo dos deuses para dá-lo aos homens. O fogo é esse elemento que representa o desejo, a força que nos movimenta a realizar nossos sonhos. Com o fogo nos aquecemos, transformamos materiais, forjamos armas e iluminamos a noite, de fato e simbolicamente. Prometeu deu aos homens condições de acreditarem serem melhores.

Mas Prometeu foi punido por Zeus, a autoridade divina. Foi exilado, preso a uma rocha e condenado a ter o fígado eternamente devorado por uma águia.

Assim como no mito, a autoridade do presidente foi destituída não pelo rito democrático mas por uma autoridade maior que é a voz de deus. Por isso a imagem da Bíblia esteve associada à tomada do palácio presidencial, notem que nesta foto e em tantas outras a Bíblia usada tem na sua capa essa referência a autoridade divina bem clara.

verbenna yin


Jung diz que os arquétipos são "sistemas vivos de reação e prontidão que, por via invisível e, por isso, mais eficiente ainda, determinam a vida individual."

Quando a gente se pergunta como certas coisas ainda acontecem em 2019, lembrem-se dessa força viva que são o arquétipos e que são capazes de trazer à tona de forma tão irracional nossos aspectos escondidos e ainda não assimilados. É nosso dever pensar, falar a respeito, debater ideias sobre estes acontecimentos porque é essa elaboração que será capaz de superar preconceitos e retrocessos coletivos. Quando a gente conscientiza esses aspectos arquetípicos, saímos do domínio do irracional e a própria matriz do inconsciente coletivo se reorganiza.

terça-feira, 12 de novembro de 2019

Lua Cheia em Touro - 12/11/2019

verbenna Yin


A Lua Cheia em Touro acabou de se encontrar com Urano e marca sua posição fazendo um circuito energético celeste que promoverá grandes realizações no mundo concreto unindo a energia da Terra e da Água – energias femininas de resistência e determinação. O ascendente é Aquário e o potencial de rebeldia e insubmissão estarão no ar nos próximos dias, indicando que as realizações serão de uma nova ordem.

Sol está conjunto a Mercúrio retrógrado em Escorpião, nossa percepção fica mais aguçada e sentimos o que precisa ser revisto, revisitado, descoberto. Farejamos o segredo, o que estava escondido, encoberto e vamos exatamente na direção disso. Somente um olhar mais atento que o regular será capaz de perceber aquilo que vinha se mantendo escondido do consciente e para isso a Lua, senhora das ondas cerebrais, entrega sua chave para que tudo aquilo que não era possível enxergara num nível ordinário de consciência, possa ser visto plenamente agora na sua fase cheia.

Sol e Mercúrio em Escorpião estão em alinhamento direto com Netuno e Lilith em Peixes, fazendo com que a gente abra os olhos e se dê conta do que acontece de verdade ao nosso redor. Netuno mantinha essa verdade enevoada, distorcida por muito tempo já, mas nesta Lua Cheia nosso ponto de percepção muda e somos capazes de entender aquilo que até ontem não era possível. Lilith participa dessa tomada de consciência nos levando ao reino da raiva e fúria por termos sido permissivos durante tanto tempo. Essa raiva é importante, pois é esse sentimento que mobilizará as energias de realização abertas neste portal.

Marte em Libra e Urano em Touro também em se alinham numa oposição curiosa, de elementos incompatíveis que acirram a irritação e a inquietude. Terra e Ar é tempestade de areia, a visão descortinada pode machucar os olhos e se não estivermos preparados podemos ser sufocados pelas suas implicações grandiosas.

Por outro lado, a Lua Cheia estará em trígono com Saturno/Putão em Capricórnio, um ótimo aspecto que confere resiliência e robustez pra gente aguentar o tranco. O Sol em sextil com esse mesmo aspecto é um bom significador de que conseguiremos sim assimilar todas essas verdades que estarão vindo à tona nos próximos dias.

Vênus em Sagitário rege a área ativada desta lunação (relacionamentos) e é a única que recebe e faz aspectos desafiadores com Netuno e Lilith. Não serão dias fáceis para o amor, as revelações destes dias podem impactar nossas idealizações românticas e minar os sentimentos, em Sagitário teremos que lidar com a mais absoluta verdade e com isso, infelizmente, podemos minar as relações com aqueles sincericídios que nos marcam em brasa quente. Para superar este momento será necessária muita compreensão e empatia para captar o que o outro está nos demonstrando como sua verdade pessoal, entrar nesse reino pessoal dele e tentar apreender que mundo é esse que ele está compartilhando com você.

Por outro lado, pode ser que as descobertas te mostrem que o outro tem valores pessoais com os quais você realmente não concorde e aí os céus te desafiam a romper como essa relação onde já ficou clara a incompatibilidade. Saturno em Capricórnio fortalece esse posicionamento que impõe limites de acordo com a sua consciência, não tenha medo de se afastar de quem não vê o mundo da mesma forma que você pois olhando para direções diferentes vocês não vão interagir construtivamente. Pare de perder seu tempo e se ame mais.

A Lua passou por Urano em Touro para se tornar cheia, então o que os céus estão propondo pra nós é o reconhecimento de que a estrutura atual não comporta mais o pulso de vida, essa estrutura que estamos acostumados está em ruínas. É necessário abandonar as estruturas antigas e construir novas bases. Teremos que reformular aquilo com o que não compactuamos mais, seja uma relação afetiva, seja uma relação familiar, amizades, grupos que frequentamos ou mesmo o nosso entorno social. Urano é o caos que precede uma nova ordem e todo o movimento dos astros nesta lunação pode sim nos jogar nesse caos.

Este será um tempo para descobrir traições, perceber situações injustas, alguém dar com a língua nos dentes e fazer confissões aviltantes ou revelar segredos perigosos. Com o ascendente em Aquário impactado por Urano, nossa reatividade pode vir numa explosão emocional forte, vontade de jogar tudo para o ar e sair correndo pra longe. E talvez essa energia impulsionadora do ar seja mesmo o que precisamos para abandonar de vez as estruturas comprometidas nas quais insistimos em viver. O mundo está cheio de ruínas pra nos lembrar que por melhor e mais desenvolvida que tenha sido uma civilização, outra chegou.

Coletivamente, nas próximas duas semanas estaremos com aspectos bastante tensos no céu e as reações populares estarão cada vez mais acirradas. Já vimos as manifestações chilenas e agora uma tomada de poder está em curso na Bolívia, anunciando que uma onda mais inovadora está chegando por aqui. O Brasil tem ascendente em Aquário que coincide com o ascendente desta Lua Cheia, bem como Marte em Escorpião no ponto onde ocorreu a lunação, então podemos esperar eventos surpreendentes por aqui também.

Esse período mais tenso deve ter seu ápice no dia 24/11, quando a Lua ativa a oposição Marte/Urano pra valer e Mercúrio sai da retrogradação entrando na área de sombra, forçando essa visão realista daquilo que a gente não queria ver até então. As relações do poder com as grandes mídias estão para ser desmascaradas e quem está atento não vai mais aderir à narrativa dominante. Nessa data Vênus estará alinhada a Júpiter em Sagitário e nos lembra de que não há nada mais precioso que a verdade, verdade nos situa concretamente e é só lidando com o real que podemos de fato expandir nossa consciência e nossas possibilidades na vida.

Força, meus amores. Grandes aventuras estão só começando, até a grande conjunção de Janeiro teremos um período para nos prepararmos, não se distraiam.

terça-feira, 5 de novembro de 2019

Filme Coringa - análise psicanalítica

verbenna yin

Hoje quero falar um pouco sobre o filme Coringa (2019) nessa versão estrelada por Joaquim Phoenix que encarna o vilão das histórias em quadrinhos de uma foram surpreendentemente humana.

Já nas primeiras cenas do filme o personagem principal, ainda Arthur Fleck, é mostrado como um palhaço profissional que está fazendo sua maquiagem, um rosto com um grande sorriso vermelho estampado. Porém sua atitude não é de alegria, ele está com o olhar mais distante e em certo momento uma lágrima escorre. O palhaço está triste. E já nesta primeira cena entramos em contato com essa dimensão dicotômica na qual todos nós nos identificamos com o personagem, com as ambivalências dos sentimentos. Todos somos capazes de reconhecer essa polaridade que existe dentro da gente, amor e ódio, alegria e tristeza, inveja e gratidão e por isso nos reconhecemos de imediato com o personagem logo no início do filme.

Afinal, quem nunca teve que forçar um sorriso e fingir que estava tudo bem?

Além disso, o personagem está em conflito pois depende de medicamentos psiquiátricos para manter a saúde estável e conta com a ajuda do serviço social para isso, porém é informado que essa ajuda será interrompida e não terá mais acesso aos remédios, antevendo assim os desdobramentos da sua doença mental.

Também no início do filme Arthur Fleck é agredido por um grupo de garotos sem conseguir se defender, mesmo caído no chão os garotos continuam chutando e batendo nele. Isso nos mostra o quanto Arthur é de fato impotente diante da vida que se impõe, ele não consegue se posicionar nem realizar o que de fato deseja fazer.

Em casa, Arthur cuida da mãe idosa e doente mentalmente. A mãe o chama de "Feliz" e ele conta pra ela que está se preparando para fazer um Stand-up Comedy, uma apresentação de humorismo. Tem um sonho de um dia participar de um programa de TV como convidado, onde contaria piadas engraçadas fazendo todos rirem e receberia de volta o abraço com elogios do apresentador.

Com tudo isso a gente percebe o quanto Arthur internalizou o discurso da mãe, que o vê como alguém que precisa levar alegria adiante. Ele incorporou esse desejo dela não só atuando como palhaço profissionalmente mas também desenvolvendo uma risada bem sonora, descontrolada, a qual ele não consegue parar e acaba incomodando os outros com isso. Essa risada é um grande sintoma que metaforiza todo o processo de alheamento de si-mesmo, pois ele não consegue ser outra coisa senão o desejo da mãe. Outro sintoma é sua aparência física, ele é extremamente magro e pálido, sem energia, e passa uma imagem de quem está faminto, desnutrido e não encontra saciedade.

Arthur não teve pai, não se sabe quem seria esse pai e ele viveu uma completa ausência da figura paterna responsável pelo processo de inclusão do indivíduo no mundo simbólico. Percebemos que Arthur tem dificuldades com limites, haja vista sua risada descontrolada, bem como já desenvolveu alucinações sobre um relacionamento afetivo com a sua vizinha. Neste ponto, a foraclusão lacaniana explicaria um tanto a estrutura psíquica desse sujeito no ambiente da psicose, pois a ausência da castração paterna (nome do pai) impede o processo regular de simbolização e o reconhecimento dos desejos internos.

A mãe por sua vez é narcisista e vive com o filho numa dinâmica também narcísica onde o faz acreditar que ele seja aquilo que ela vê e deseja, mas ao mesmo tempo não o confirma. O filho se esforça para agradá-la mas ela não corresponde, inclusive rejeita o esforço que ele faz. Quando ele conta que irá se apresentar no Stand Up ela responde ironicamente que "ele não tem graça", desqualificando seu esforço em agradá-la e gerando nele sofrimento pela falta de acolhimento.

Por outro lado, Arthur realmente não tem muito talento para fazer rir e inclusive precisa pensar e escrever as piadas que pretende contar, demonstrando que existe um conflito entre o que ele é de fato e o que ele acredita ser.

Então esse personagem que vive suas ambivalências, está numa condição vulnerável socialmente, dependente de uma medicação que não será mais fornecida, está também diante de um conflito importante que é o reconhecimento de que seus desejos próprios não tem lugar no mundo onde vive e ele não conseguirá realizá-los.

Quem realiza no mundo é o Ego, é essa a instância que consegue se relacionar com as pessoas e que concentra aquilo que conhecemos sobre nós. Mas para que o ego se estruture adequadamente e possa cumprir suas funções são necessárias algumas condições basilares de desenvolvimento:
- RECONHECIMENTO
- VALORIZAÇÃO
- PERTENCIMENTO.

O reconhecimento vem da figura materna, que ao atender os desejos primitivos do bebê confirma sua existência e valida suas necessidades, fazendo surgir um canal de circulação positiva da libido. Em seguida, a valorização do indivíduo vem da figura paterna, que no processo de castração e imposição de limites faz com que o sujeito perceba suas próprias capacidades e consiga se sustentar sozinho, levando-o a um passo adiante na circulação libidinal que é o querer-realizar. Já o pertencimento é o ambiente de acolhimento e segurança onde nos sentimos parte de algo maior, aprendemos a fazer ajustamentos nos nossos impulsos para seguirmos conectados ao grupo ao qual nos identificamos e  isso reforça as características próprias que reconhecemos em nós.

Para Arthur faltaram esse 3 aspectos, a mãe não o reconhecia como indivíduo desejante, ele não desenvolveu um senso de valorização pois a figura paterna foi ausente e ainda não possuía núcleos afetivos que conferissem a sensação de pertencimento. O Ego dele não deu conta.

E com todo esse contexto, Arthur recebe "de presente" uma arma, esse objeto fálico que irá transformar sua vida para sempre. Ele de alguma forma reconhece o poder contido nesse objeto, de uma forma totalmente inadequada o leva para uma apresentação cômica num hospital infantil, demonstrando que se vinculou ao objeto e construiu um certo significante a partir dele.

A partir daí, Arthur passa a ter reações mais agressivas. Mata com a arma os rapazes do trem que o estavam assediando e em seguida performa uma dança solitária e muito envolvente consigo mesmo no espelho de um banheiro público, num retorno talvez ao estádio do espelho onde possa reaprender a se ver e a se reconhecer e assim, finalmente, conseguir lidar com sua própria esfera desejante.

Em seguida Arthur mata sua mãe por sufocamento e nesse ato confessa que sua vida "era uma grande comédia". O sufocamento da mãe aparece como contraponto à sua necessidade de afirmação, pela palavra, daquilo que é o seu real e aqui o indivíduo passa para um autorreconhecimento muito importante que irá conduzir a narrativa daí pra frente já de uma maneira muito mais apropriada de si mesmo - ainda que as escolhas do personagem recaiam na agressividade e violência.

As mortes também evidenciam como Arthur Fleck não consegue simbolizar, as vozes que o incomodam agora precisam ser caladas literalmente e ele age no mundo real matando de verdade e assim confirmando sua existência.

Ele diz: "Durante toda a minha vida eu nem sabia se eu realmente existia. Mas eu existo, sim."

Por último Arthur se transforma em Coringa, se apoderando de uma imagem visual própria e que evoca a figura do Joker do carteado. Ele surge numa escadaria e dança novamente, uma dança mais segura e firma, uma performance. O Coringa está diante da oportunidade que tanto queria sendo convidado a participar do programa de televisão. Porém, ao ser entrevistado, o Coringa percebe que a intenção do apresentador não é exatamente mostrá-lo como um comediante mas sim como a própria piada, numa exploração do seu sofrimento pessoal. Ele fica bastante afetado emocionalmente e reage matando o apresentador em rede nacional, usando a arma (objeto fálico) para fazer cessar aquela situação de incompreensão e exploração da sua dor.

Dali em diante o Coringa passa a ser um símbolo social e a cidade vive um momento de revolta coletiva, com pessoas fantasiadas também de Coringa e desafiando a ordem e a autoridade, numa correspondência entre o individual e o coletivo e sugerindo, tal qual Jung, que o processo de um único indivíduo tem o condão de afetar também a sua coletividade. O tempo todo o filme mostra analogias entre o que se passa individualmente com Arthur Fleck e a cidade, o ambiente tóxico, a fumaça constante de cigarro, o lixo acumulado pelas ruas, a poluição e as cores cinzas da cidade. Da mesma forma, quando Arthur se transforma em Coringa e retoma pela arma sua narrativa própria, estoura uma revolta social na cidade que agride as figuras de autoridade (policiais e prefeito). Símbolos que vão registrando a chegada de uma nova ordem, uma reorganização do sujeito e, por consequência, o caos efervescente do seu meio.

E neste turning point da trajetória de Arthur em Coringa me parece muito oportuna a frase de Nietzche, quando propõe a ideia do Übermensch, o Super-Homem ou o Além-do-Homem como criatura capaz de fazer a organização estabelecida voltar a um ponto zero para ser reiniciada.

Ele me parece esse além-do-homem justamente porque ao reclamar sua existência e retomar o seu poder, o Coringa não se fixa a nenhuma das estruturas psíquicas freudianas: ele poderia ser perverso mas deseja e demonstra afeto, até poupou o anão e o deixou sair; ele poderia ser psicótico e realmente alucina um relacionamento com a vizinha, mas ele retorna dessa fantasia e faz isso sem uso de medicação; ele tem no corpo uma conversão histérica da risada como manifestação do desejo da mãe mas já não tem mais o desejo de se ajustar neuroticamente.

O que é o Coringa, afinal?

"É preciso ter o caos dentro de si para fazer surgir uma estrela dançante." O Coringa dançou ao se reconhecer no espelho, num gesto de espontaneidade de quem finalmente abriu caminho para a própria libido se expressar com liberdade de movimentos. Ele voltou ao ponto de partida e vai reescrever a estória.

O Coringa encarna em sua trajetória individual os requisitos que o tornam esse Além-do-homem, à sua maneira mais agressiva e violenta, mas que num universo dual, de polaridades e ambivalências, o torna o precursor do real Super-Herói (Batman) que irá surgir num segundo momento como resultado de sua ação numa tentativa de restabelecimento do equilíbrio da ordem em novas bases.

E pra finalizar, deixo aqui o vídeo do Youtube onde falei sobre o filme numa analogia bem interessante com o TAROT, onde a gente encontra esses conceitos já formulados e simbolizados graficamente. Ative as legendas :-)