segunda-feira, 26 de novembro de 2018
Codependência e Autoimportância
A CODEPENDÊNCIA tem sido uma tônica bem presente nos meus últimos atendimentos. E como fundamento da psicanálise, só nos chegam (e ficam) os casos que representam situações por onde nós terapeutas já caminhamos, e eu afirmo: esse caminho eu conheço bem.
Esse quadro, também chamado de dependência emocional, geralmente se estabelece entre casais mas pode ocorrer em outras configurações de relacionamento como entre amigos ou entre chefe-funcionário. Tem como tônica a manipulação que é exercida entre uma personalidade mais contundente, e geralmente compulsiva e por isso "dependente", que é satisfeita pela outra personalidade mais permeável e influenciável, a "codependente".
É mais visível quando a dependência da personalidade dominante tem um foco definido: drogas, álcoól, sexo, jogo. Mas existem dependências muito simpáticas e socialmente aceitas, como a dependência do trabalho por exemplo, onde a ausência é entendida como atenção à subsistência da família.
Nesse quadro, a personalidade codependente presta todo o auxílio necessário a que o outro possa exercer livremente sua dependência, é permissiva e muitas vezes lida sozinha com as consequências negativas da ausência, no que geralmente é muito eficiente.
Muitas mulheres vivem essa dinâmica psicológica notadamente em relacionamentos abusivos, por conta do estímulo cultural ao arquétipo feminino de mãe e esposa sempre submissa, disponível e valorosa defensora da família constituída. Nessa programação, muitas mulheres acreditam que seu valor esteja em atender a personalidade dominante do parceiro pois esse esforço dela é não só socialmente esperado como também valorizado. Afinal, a "mulher sábia edifica o seu lar" e as mulheres são especialmente eficientes em manter a organização familiar funcionando muito bem, apesar das atitudes do parceiro abusivo.
Aí que essa eficiência toda parece ser sinal de que tudo vai bem, tudo está sob controle e a visão dos outros nos aprovando confirma a sensação de que está tudo certo.
Até o dependente reconhece: "como seria minha vida sem você?"
"Por isso que eu te amo!"
Mas a que custo pessoal para o codependente?
A custo de muita renúncia, de insatisfação, de desconforto e cansaço físico, oportunidades perdidas... Coisas que nenhum dinheiro compra e que tempo nenhum retrocederá para que o codependente busque de volta os momentos que deixou de viver por si mesmo. Sua melhor energia foi destinada a cobrir os buracos que o dependente deixou, para pagar suas dívidas, para explicar o mal entendido, para reparar o que o outro quebrou e suprir o que ele não quis dar.
Você reconhece esse lugar? Pois é, a codependência é o cenário emocional de muita gente. Mas ele esconde uma dura verdade, que é a nossa necessidade de nos sentirmos importantes. A codependência é a sala da AUTOIMPORTÂNCIA.
Essa palavra eu demorei muitos anos para ouvir e ela faz todo o sentido. O codependente julga que tudo que ele faz é muito importante e que sem isso o dependente não vive. Os fatos externos acabam criando uma confirmação disso, pelo que o codependente segue se esforçando para manter a relação a qualquer custo para si.
No fundo mesmo, o codependente quer ser visto, reconhecido. Ele precisa se sentir valorizado como indivíduo e encontra essa valorização no apoio irrestrito dado ao dependente. O codependente só se reconhece e se valoriza quando abre mão de si e se dedica ao outro, fazer pelo outro é um grande troféu que ele se dá e exibe para todos: "olha como eu sou importante, sem mim o fulano não conseguiria".
Algumas abordagens modernas chamam esse comportamento de "narcisimo invertido", pois o codependente admira a si mesmo, admira seu esforço e comprometimento extremos e sua eficiência em superar os problemas que o dependente cria.
Por isso é tão difícil romper com o ciclo dependência-codependência, afinal se o dependente se vai, como serei reconhecido? Como vou me sentir importante?
Fortalecer a autoestima e a independência podem ser caminhos para resgatar a autonomia nessa dinâmica, mas a consciência da AUTOIMPORTÂNCIA é a chave para transformar ativamente essa situação.
A importância que atribuímos a nós mesmos precisa sair do foco externo do "veja do que sou capaz", que busca o tempo todo confirmar que você vale porque se esforça. O esforço não é a medida da nossa existência.
O que é importante está em se sentir livre para ser o que você quiser, no seu tempo e ritmo próprios. É na liberdade que mora a espontaneidade e a alegria, e é por onde circula o amor próprio que nos dá a medida do que nos une de verdade.
Se você hoje estiver numa relação pesada demais, pare de se esforçar tanto e considere: para quê estou fazendo todo esse esforço? Será que esse preço não é alto demais?
Talvez seja tempo de desfazer amarras e testar novas posturas nos relacionamentos, de sair da posição engessada em que você se colocou para finalmente dançar pela vida com mais leveza e doçura.
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Excelente texto! Estou me descobrindo coodependente faz pouco tempo, e o reforço veio conhecendo a astrologia (Peixes na Casa 7, com Saturno Rx, Quiron Rx e Lilith), sendo q Saturno faz oposição à Vênus. É desafiador. Ainda assim confio que posso me transformar, e estou no esforço para isso. Se puder contribuir de alguma forma, aceito suas palavras, e ja sou grata
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