domingo, 16 de fevereiro de 2020

Teus olhos de mar

verbenna yin


As águas claras são um perigo
para quem não deseja se revelar
convidam à pausa a beleza
sugerem outro peso às coisas
velam pela vida incessante
que ao brotar
sobe inadvertidamente
até a superfície
para respirar

Diante das águas tudo hesita
para assumir um ritmo próprio
e uma forma inesperada

Nesse instante, ver o mar é encantar-se
na infinda entrega das correntezas
que conduzem todos os caminhos
ao inevitável encontro

Teus olhos no azul mareado de sonhos
me tecem, contornam
e no fundo da memória
a luz ainda brilha
diáfana
e um sentimento pode se refazer
vencendo a ilusão do tempo
preenchido de um desejo antigo
que nunca desistiu de pulsar

Sentir a água fresca na pele
é como ser amada
pela manhã

Entregar-se à água é acreditar
é navegar ainda mais uma vez
na completude de cheia maré
que alimenta a alma sedenta
que busca, move e tenta
transborda em noite de lua
e a memória, já de luz repleta
conduz confiante
o coração espiralando
rumo ao que sempre é

E no limite da miragem, que é areia
ora à frente, ora atrás
retorno e agora sou eu que me retraço
mas talvez seja eu tão errante
como a matéria
efêmera
que a água fez pérola
tão permeável
às ondas e emoções
que levo impregnado o brilho
dos teus olhos de mar em mim

Sentir a água em ondas é reviver
ainda que o preço da vida seja, enfim,
dissolver
no próprio amor
que um dia foi
mar.

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