E vem chegando mais um reinício de ano com promessas de grandes aprendizados coletivos e, pela abordagem do Tarot, o ano de 2022 promete mesmo vir com lições valiosas para todos. A soma dos algarismos de 2022 dá 6 e podemos estabelecer uma correspondência com o arcano VI do Tarot, os Enamorados – uma carta que fala dos nossos relacionamentos, mas que na verdade vai bem além disso.
Tradicionalmente, os Enamorados mostram um casal se aproximando e sendo abençoado com a presença de um anjo ou de uma pomba, o que na tradição alquímica representa a entrada do terceiro elemento que é o amor, o elo que sustentará o vínculo para que a união se desenvolva e as partes possam atingir seu potencial de crescimento juntas.
Este é o mistério da conjuntio, a promessa de que um mais um podem ser mais do que dois pois a partir da conexão verdadeira desses dois elementos algo novo se forma e chega à vida, anunciando um grande potencial de realização.
Este primeiro significado dialoga muito com o momento atual em que estamos vivendo na esfera coletiva, com reaproximações de várias ordens desde a maior circulação de pessoas após a vacinação em massa mas sobretudo no campo da política em que estamos acompanhando uniões antes impensáveis, indicando que este será um período para re-unir propostas e visões de mundo a fim de retomar um crescimento conjunto que vinha sendo represado pelas divisões e polarizações. Especialmente nos últimos dois anos, que foram anos dos arcanos IV – Imperador e V – Hierofante, vivemos uma espécie de rigidez nas opiniões pessoais, muitas pessoas se mantiveram na defensividade no afã de provarem seus pontos de vista e a importância das suas regras, mas na prática o que vivenciamos foi um afastamento das pessoas queridas e uma desinformação planejada para separar e enfraquecer.
2022 tem tudo para ser um ano de reuniões, em que possamos novamente sintonizar com o potencial do esforço conjunto nas ações coletivas mas também de curar os efeitos negativos de tanta separatividade e intolerância que andamos experimentando. Somos pessoas e as emoções fazem parte da nossa constituição, não podemos ser completos sem a expressão desse campo dos sentimentos e da sensação de união na corrente com os outros, e um ano 6 pode nos restituir essa vivência da união de uma forma muito inspiradora.
Mas quero aprofundar o olhar para o arcano dos Enamorados chamando a atenção para um outro aspecto que fica mais aparente nas representações imagéticas dos tarôs mais recentes, como o Tarot de Thoth. Lady Frieda Harrys faz uma leitura toda especial desse arcano, talvez já alinhada com os conceitos da psicanálise que estavam muito em voga nos anos 30 quando este tarô foi desenhado, e que inclui os mecanismos da projeção e da identificação projetiva.
Pela psicanálise, muito dos nossos conteúdos reprimidos – aqueles aspectos nossos que não ousamos admitir, que não combinam com nossos valores familiares ou religiosos ou ainda que não percebemos por sermos imaturos – são vislumbrados apenas nas outras pessoas e isso faz com que nos aproximemos delas a fim de tomar contato, indiretamente, com esses conteúdos.
Como negamos esses aspectos em nós, ou seja, imaginamos que eles não fazem parte de nós, apenas conseguimos enxergá-los nos outros. Isso se chama projeção.
Mas a coisa segue e Frieda Harrys apresenta na carta dos Enamorados um cenário de união baseado totalmente na projeção, um casamento em que cada parte é exatamente o oposto da outra. Acima, uma figura sacerdotal abençoa a união com os braços entrelaçados numa fita de Moebius, também um elemento da psicanálise usado principalmente por Lacan para se referir à ambiguidade do discurso e da construção muitas vezes distorcida da autoimagem, num processo de imaginar-se algo diferente do que se é de fato.
E daqui pegamos o gancho da identificação projetiva, que é justamente a operação desse mecanismo que nos leva à aproximação do outro idealizado, um outro que pressentimos que nos “complementa” e que na verdade é o nosso próprio espelho. Pois se na projeção eu não admito que sou algo (aspectos reprimidos) e projeto esse conteúdo fora de mim, na identificação projetiva me aproximo justamente desse outro projetado, idealizado, e assim na reunião poderei me reconhecer nesse espelho invertido – o que nos mantém enamorados dessa outra pessoa, numa sensação de refúgio quando estamos diante da sua presença, uma expansão própria que só acontece quando estamos unidos um ao outro.
Um ano regido pelo arcano dos Enamorados promete que tomemos consciência desse mecanismo em ação, tanto das projeções que fazemos – e isso nos convidará a reconhecer aspectos próprios que não vamos gostar de reconhecer – como também das identificações projetivas que andamos vivenciando nos últimos anos e fizeram com que a gente se engajasse tanto com certos posicionamentos ou seguisse cegamente certas figuras de liderança, nos identificando com elas inconscientemente.
Sob o arcano VI, poderemos nos dar conta dessas associações para que finalmente entremos em contato com verdades sobre nós, talvez desagradáveis, que não admitiríamos assim tão espontaneamente mas que é necessário reconhecer para sairmos dessa postura infantil e narcisista de quem tem sempre razão.
Na esfera coletiva este será um grande aprendizado. Somos um país que não tem acesso à própria história, recebemos informações equivocadas na educação formal para nos imaginarmos instruídos quando na verdade não conseguimos reconhecer as mesmas mentiras reproduzidas por gerações de políticos que sempre se beneficiam com a credulidade das pessoas. Somos levados a crer que só porque convivemos com pessoas diferentes de nós não sejamos racistas, sexistas os homofóbicos, quando na verdade podemos estar defendendo sem perceber sistemas de opressão que causam sofrimento real pois esse mesmo sistema nos beneficia de alguma forma.
Quando nos dispomos a olhar honestamente para nós mesmos, superando as projeções e compreendendo mais a fundo essas negações que distorcem a realidade e adiam nosso crescimento, aí sim teremos alguma chance de prosseguir na união pois as diferenças já não nos assustarão mais, o diferente deixa de ser uma ameaça e passa a ser um elemento de apoio do processo de reconhecimento próprio e fortalecimento pessoal.
Sem dúvida, 2022 revelará a nossa real face e deve nos conduzir por verdades difíceis de encarar, num grande aprendizado coletivo e de autoanálise, muito necessário. Por outro lado, o arcano VI pode nos inspirar mostrando o quanto podemos construir juntos a partir das reuniões e das sinergias quando saímos da defensividade, ativando as diferenças entre nós como complementariedades de forma positiva para fazermos juntos algo que sozinhos não alcançamos.
Que os céus abençoem esta união.
Verbenna Yin
Astros - Tarot - Psicanálise
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