quinta-feira, 24 de março de 2022

A doença para Ferenczi

ferenczi

Na experiência constante da clínica, percebemos que alguns adoecimentos são formas de adaptação a condições de vida que não foram desejadas pela pessoa mas que ela permanece ali naquele contexto seja porque não se deu conta ainda do quanto é afetada pelo contexto, seja porque não tem condições de sair com independência dali ou ainda porque acredita que esse é um preço a se pagar por algo que estaria mais ali à frente.

Num exercício criativo com uma paciente com esse perfil, ela confidenciou que o sentimento que ela mais experimenta na atualidade é o de frustração, sente-se frustrada todos os dias - principalmente no exercício do trabalho. Perguntei então qual era o gosto da frustração e ela foi bem rápida: sabor de rabanete.

Perguntei em seguida o que aconteceria se todos os dias ela tivesse que comer rabanete, respondeu que passaria mal certamente. E vejam só, ela tem mesmo um problema de saúde recorrente que é a inflamação intestinal. Perguntei então por que ela se submete ao sentimento de frustração todos os dias, mas aqui não soube responder. Essa ainda é a busca dela: o que ela quer?

Ferenczi tem esse texto famoso sobre as psiconeuroses em que traz a ideia de que "a doença é a vida em outras condições". Não são as condições ideais, as condições queridas, mas as condições às quais nos adaptamos sem perceber - adaptações que têm seu preço pois causam desequilíbrios notáveis. Ao seguir no texto, ele também questiona os métodos de repressão dos sintomas, como a hipnose, ou a aparente melhora do sintoma quando a pessoa é afastada do ambiente adoecedor, pois com o tempo o sintoma retorna. Para ele, essas melhoras temporárias não são curativas pois o verdadeiro adoecimento é SER INCAPAZ DE QUERER.

E aqui ele faz a defesa da psicanálise como um "esforço não por fazer esquecer os conflitos, mas por torná-los conscientes, habituando o doente, por uma espécie de reeducação, a suportar corajosamente as representações penosas que contém em si, a fim de não ter que fugir delas na doença, na produção de sintomas mórbidos simbólicos."

Entender um adoecimento é fundamental, mas encarar de frente o itinerário de construção orgânica e simbólica do sintoma é o que pode curar. E nesse enfrentamento, precisamos também levar em conta as questões estruturais (o capitalismo, o sistema de classes, o machismo, o racismo, etc.) e todos os atravessamentos que nos impedem de exercer o desejo, para entender com profundidade qual é a causa de estarmos interditadas ou desautorizadas de querer.

Você já olhou para o seu sintoma desse jeito?

Seu terapeuta te ajuda a colocar suas questões nessa perspectiva?

Verbenna Yin
Astros - Tarot - Psicanálise

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