Uma questão constante feminina é a relação com o próprio corpo, somos reiteradamente apresentadas a soluções mágicas para conquistar a pele, o cabelo e o corpo ideais (segundo quem?) e com isso ter garantia de bem estar e da admiração do masculino (que ainda hoje é entendida como passe para aceitação).
Mesmo sabendo do poder da propaganda e para onde isso leva (comprometimento da renda e do tempo das mulheres), não somos imunes aos efeitos dessa lógica pois ela nos atinge num lugar muito íntimo e emocional, um ambiente interno em que a capacidade de raciocínio não é suficiente para neutralizar esse efeito.
No livro "A coruja era filha do padeiro", a autora Marion Woodman afirma que os distúrbios alimentares como obesidade e anorexia são sintomas de uma profunda desconexão entre os aspectos intrapsíquicos da mulher: ela não consegue chegar a uma totalidade pois falta a referência do feminino original. Nenhuma mulher antes dela conseguiu chegar nessa referência, todas já nasceram num mundo organizado de tal forma (patriarcado) que essa referência seja ausente.
Essa desconexão é sugerida na forma da coruja, que consegue girar a cabeça em 360º, assinalando a separação da cabeça e do corpo - que é o conflito vivido pelas mulheres, um corpo continuamente à disposição das projeções masculinas e indisponível para seu próprio desenvolvimento. A mulher que usa e goza com seu corpo ainda é julgada e preterida, até por ela mesma.
Um dos trechos mais fortes do livro é esse aqui:
" O que uma mulher sem feminilidade vê no rosto de uma mulher semelhante? O que uma filha destas vê no rosto de uma tal mãe? Está claro que a única coisa que ela pode ver é a rejeição, talvez combinada com um desafio ou com um cinismo sutis. Com muita frequência, esse abismo é reforçado pelo desprezo inconsciente do pai por tudo o que é essencialmente feminino. Assim sendo, a garota incorpora um sentimento de culpa inconsciente por ser o que é. Seu autossacrifício pode levá-la a tentar encontrar sua realização no mundo masculino e, ao mesmo tempo, a ser escrava de todos os homens da sua vida. A enorme alegria do "EU SOU" ela não conhece, nem a pode encontrar com outras mulheres.Os mistérios femininos de antigas culturas estabeleceram entre as mulheres um vínculo eterno - vínculo esse que as tornou orgulhosas de serem parte de uma corrente vital que flui através delas. Esse vínculo, ou o seu equivalente moderno, é o que as mulheres conscientes da nossa cultura hoje procuram restabelecer."
O caminho de fortalecimento para a mulher passa pelo corpo e pela naturalização desse corpo feminino, seus ciclos, suas particularidades e potências. Passa pela retomada desse corpo entendido como extensão da alma na dimensão da matéria, que pode sim desfrutar de toda a sensorialidade do elemento terra, sem culpa.
Recomendo muito a leitura!
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